Sabesp é liberada a fornecer água com pressão abaixo da normal

Prática, que prejudica abastecimento de casas e sobrados, foi negada inicialmente por Alckmin e admitida depois por diretor.

A Sabesp está liberada para fornecer água abaixo da pressão regulamentar na Região Metropolitana de São Paulo, sobretudo nos horários de maior consumo. No entendimento da agência estadual que fiscaliza a empresa, a alteração pode ocorrer em casos de crise hídrica.

A prática pode levar a falhas no abastecimento, sobretudo em casas térreas e sobrados, e foi inicialmente negada pelo governador Geraldo Alckmin, mas admitida posteriormente por representantes da companhia.

Uma regra da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) brasileira exige que a pressão de abastecimento seja de ao menos 10 metros de coluna d’água (mca). Essa pressão é necessária para que a água chegue até os reservatórios, que geralmente fiquem no alto dos imóveis.

A Sabesp, porém, tem diminuído a pressão para até 1 mca, o que, em tese, é suficiente apenas para que a água chegue ao cavalete de abastecimento de uma casa térrea. Uma torneira que esteja a mais de 1 metro do chão, por exemplo, já não recebe água.

A pressão abaixo da norma foi admitida em fevereiro pelo diretor metropolitano da companhia, Paulo Massato, e referendada pelo presidente, Jerson Kelman, com o argumento de que as normas “devem ser relativizadas” em situação de crise.

Esse discurso, entretanto, contraria o do governador Geraldo Alckmin. Em dezembro, o tucano afirmou que “ela (a Sabesp) cumpre a norma da ABNT, que é de ter uma coluna de dez metros de água”, para defender a regularidade do programa de redução de pressão praticado pela companhia.

Após a fala de Massato, a Arsesp – Agência Reguladora de Saneamento e Energia de São Paulo, que fiscaliza a Sabesp, alegou que não havia sido informada da redução da pressão até 1mca e cobrou explicações. Na resposta, obtida pelo iG, a companhia argumenta que a norma da ABNT permite o fornecimento de água abaixo de 10 mca, desde que haja justificativa técnica e econômica.

“Em uma situação real de operação da distribuição de água, especialmente com as restrições atuais oriundas da crise hídrica, a pressão dinâmica pode momentaneamente ficar abaixo dos 10 mca, conforme a demanda daquele momento e, principalmente, nos horários de maior consumo, em consonância com o previsto na própria norma”, informa o texto.

A Arsesp concordou com a Sabesp, de acordo com uma análise técnica feita por um assessor da diretoria de fiscalização obtida pela reportagem. O texto, que deve balizar a decisão final da agência sobre o caso, vai contra um entendimento preliminar e informal existente no órgão de que reduzir a pressão para 1 mca é irregular, segundo o iG apurou.

Uma discordância da Arsesp significaria um golpe na principal ferramenta do governo Alckmin para diminuir a retirada de água do sistema Cantareira, o maior da região metropolitana e que sobrevive graças ao volume morto. Entre janeiro de 2014 e março deste ano, o volume extraído do manancial caiu de 31,9 mil para 17,9 mil litros por segundo, sendo que 42% da economia foi conseguida com a diminuição de pressão.

Procurada, a Sabesp reiterou que não há irregularidade em fornecer água abaixo de 10 mca. “A Sabesp esclarece que há um equívoco na informação que a companhia reduz a pressão abaixo do permitido pela Norma da ABNT. Em situações em que o direito coletivo está ameaçado, os valores da pressão estática superiores às máxima e da pressão dinâmica inferiores à mínima podem ser aceitos, desde que justificados técnica e economicamente, conforme item 5.4.1.2 da NBR 12.218 [número da norma da ABNT]”, informou a companhia, em nota.

Cortes não zeram pressão, diz companhia
Na nota, a Sabesp também admitiu que tem fechado registros em algumas regiões da cidade, como o iG revelou em 6 de fevereiro, e diz que a atitude não zera a pressão na rede de abastecimento. A companhia não deixou claro, entretanto, se prejudica ou não o fornecimento de água, como denunciaram dez funcionários da empresa ouvidos sob condição de anonimato pela reportagem.

“Não é possível afirmar que os fechamentos de válvulas em campo correspondem à completa despressurização das tubulações (…)”, diz a nota. “A realização de manobras nas redes está associada não só à necessária redução de pressão para combate às perdas, mas também ao direcionamento das vazões disponíveis para abastecimento de determinadas áreas ou pontos críticos em diferentes horários do dia, de modo a que todas as áreas recebam água nos horários programados, amplamente divulgados.”

Os fechamentos de registro têm sido feitos nos locais onde a Sabesp ainda não instalou válvulas redutoras de pressão (VRPs), que cobrem menos da metade (45%) das áreas atendidas pela companhia da companhia na Região Metropolitana de São Paulo.

Engenheiro civil com ênfase em hidráulica e professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, Urandi Gratão diz que é possível fechar registros e não cortar o abastecimento em uma determinada região.

“Fechar um registro não significa que vai faltar água naquele setor, pois há mais de uma entrada”, afirma Gratão. “Desde que se saiba o que se está fazendo.”

Do iG