Lei de SP pode afetar cadastro de devedor, dizem órgãos de crédito

Nova norma exige assinatura do inadimplente para colocar nome na lista. Antes, a notificação era feita por correspondência comum.

Serviços de proteção ao crédito afirmam que a entrada em vigor da lei estadual 15.659 vai tornar o crédito mais caro, dificultar a identificação de maus pagadores e prejudicar os consumidores que mantêm as contas em dia.

A lei exige que devedores em atraso sejam notificados não mais por correspondência comum, mas por aviso de recebimento (AR) sobre seus débitos antes do lançamento no cadastro de inadimplentes. Ela vale apenas para os casos em que a dívida não foi protestada ou não estiver sendo cobrada diretamente em juízo. Ela diz que “a inclusão de consumidores no cadastro de inadimplentes deve ser previamente comunicada por escrito e comprovada mediante o protocolo de aviso de recebimento (AR) assinado no endereço fornecido pelo devedor”.

Proposto pelo deputado estadual Rui Falcão (PT), o projeto 1247/ 2007, que deu origem à lei, foi vetado pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) em 2013, mas a Assembleia Legislativa de São Paulo derrubou o veto.

Na justificativa do projeto, o deputado diz que busca garantir aos consumidores o direito à informação escrita sobre sua situação de crédito e a certeza de que serão comunicados quando houver o lançamento de seus nomes no cadastro de inadimplentes.

A lei entrou em vigor em 9 de janeiro de 2015 e iniciou-se uma batalha jurídica. A Federação das Associações Comerciais de São Paulo (Facesp) entrou na Justiça Estadual com uma ação direta de inconstitucionalidade e obteve liminar favorável.

No entanto, em agosto, o Tribunal de Justiça de São Paulo revogou a liminar e suspendeu a ação até o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) de três outras ações ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas contra a mesma lei.

O economista Marcel Solimeo, da Associação Comercial de São Paulo, defende que a lei seja integralmente derrubada. Ele entende que é falta de bom senso exigir o aviso de recebimento para notificar devedores inadimplentes enquanto outros avisos de débito, como da Prefeitura, concessionárias de água, luz e gás são entregues como correspondência comum.

Solimeo destaca ainda que a carta com AR custa seis vezes mais do que o aviso comum e esse custo de alguma forma será repassado ao consumidor.

Outro inconveniente é que em muitos lugares, como cidades do interior e bairros distantes do Centro, as correspondências não são entregues diretamente ao destinatário, dificultando o preenchimento do aviso de recebimento.

Também destaca que se o devedor ou subordinados a ele se recusarem a assinar a correspondência ou simplesmente ignorá-lo, a tentativa de notificação perde o efeito. Além disso, segundo Solimeo, essa lei estadual entra em confronto com o sistema nacional, criando desequilíbrio nos estados.

De acordo com a Serasa Experian, “a obrigatoriedade do envio de correspondência com aviso de recebimento (AR) para consumidor com dívida em atraso, antes de encaminhar seu nome à lista de inadimplentes, coloca em risco o mercado de crédito, pois impede a atuação dos órgãos de proteção ao crédito e facilita o protesto em cartório, deixando, assim, muito mais caro e demorado para o consumidor o processo de “limpar” o nome e restringindo, ainda mais, às famílias a obtenção de novos empréstimos.”

Segundo a Serasa, “a carta AR substitui a correspondência simples, com aviso de postagem, usada há mais de 30 anos, com comprovada eficácia, e torna o Estado de São Paulo “o único lugar do mundo a exigir a assinatura/consentimento do cidadão para ser considerado inadimplente.”

Nos cálculos da Serasa, a consequência prática e direta da aplicação dessa lei é que, do total de dívidas inadimplidas, apenas 3% estão sendo incluídas nos cadastros de inadimplentes, pois grande parte dos ARs enviados não voltou ou voltou sem a assinatura dos devedores e também a grande maioria dos setores, principalmente os pequenos comerciantes e as concessionários de serviços públicos, não tem condições de arcar com o custo do AR, sete vezes maior do que o da carta simples.

Ainda de acordo com a Serasa Experian, levantamento que dimensiona o impacto da alteração no sistema financeiro, elaborado pelo economista Marcos Lisboa, mostra que despesas dos consumidores com cartórios podem chegar a R$ 5 bilhões em um ano.

O superintendente do SPC Brasil, Nival Martins, afirma que o principal impacto negativo da lei recai sobre o próprio consumidor.

Segundo ele, atualmente, o consumidor em débito pode ir ao credor, pagar a dívida e o próprio credor retira a restrição junto ao órgão de proteção ao crédito. Com essa alteração, o custo da notificação aumenta em oito vezes e isso estimula as empresas a encaminhar o título para cartório. Por esse caminho, o cartório exige que o consumidor pague a dívida e apresente uma carta de anuência para fazer a baixa. Para realizar essa operação o consumidor tem de pagar taxas ou emolumentos ao cartório, que em alguns casos podem até superar o valor do débito.

Outra crítica é que quando a lei impõe ônus às empresas, isso pode dificultar o crédito. Além disso, a dificuldade de notificação e a consequente ausência da restrição ao inadimplente abre margem para o super endividamento.

“A lei não deveria ter aplicação. Não traz benefícios. Traz ônus para o consumidor e para a economia do país”, afirmou.

Do G1