Médicos alertam para o perigo de antibióticos sem controle

Bactérias resistentes ao remédio atingem até quem não tomou

O péssimo hábito de tomar remédios por conta própria, enraizado na maior parte da população, acendeu o sinal de alerta da Organização Mundial de Saúde, OMS. A prática pode transformar uma pequena infecção em algo até incurável. E mais: representa uma ameaça à população.

Desde 2009, o Brasil já lida com bactérias resistentes a todos os antibióticos. Por isso, o uso indiscriminado desses remédios se tornou uma das maiores ameaças à saúde e o combate à prática começa a ser intensificado pela OMS.

Bacteriologista do Laboratório de Pesquisa em Infecção Hospitalar da Fiocruz, Ana Paula Assef, explica que ações como automedicação, uso de antibiótico ou dosagens inadequados e interrupção de tratamento arriscam a vida do indivíduo. “O antibiótico mata as principais bactérias, mas não todas. As resistentes sobrevivem, podendo tornar o uso ineficaz em nova infecção.”

A dona de casa Maria Pereira (nome fictício), 54 anos, é um retrato dessa realidade. “Sempre tomei antibióticos por conta própria. Toda vez que a garganta inflamava, comprava. Agora, com a obrigatoriedade da receita, fui ao médico e só precisava de um anti-inflamatório”, conta.

Simone Nuer, infectologista do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho e professora da Faculdade de Medicina da UFRJ, também alerta. “Antibióticos são os únicos remédios que se toma como indivíduo, mas que tem efeito social. As bactérias resistentes podem infectar outras pessoas, que depois não terão remédios efetivos para combatê-la”, conta.

Segundo ela, a prescrição médica é fundamental para o tratamento. “A prescrição do antibiótico é individualizada. Depende da infecção específica contra qual a pessoa esteja lutando, e de outros remédios que ela possa tomar. Além disso, a definição da dose é fundamental”, explica Nuer.

Cadeia de contaminação no campo

Além da automedicação da população, o uso indiscriminado de antibióticos em práticas de agricultura e pecuária é motivo de preocupação. A infectologista Simone Nuer alerta para o uso de moléculas similares às de antibióticos, utilizadas no controle de pragas na agropecuária, e em hormônios de crescimento injetados em animais.

“Consumir alimentos que tenham essas moléculas também contribui para uma maior resistência das bactérias em nosso organismo”, explica.

Instituições de saúde também contribuem para o aumento da resistência aos antibióticos. Segundo a bacteriologista Ana Paula Assef, a rotina hospitalar conta com uma série de procedimentos invasivos que são portas de entrada para as bactérias, contribuindo para um aumento das infecções hospitalares e do uso de antibióticos é intensificado.

Ainda segundo a bacteriologista, outro quadro alarmante é a falta de sistemas de saneamento eficazes, que permitem o lançamento de esgoto de hospitais e domicílios no meio ambiente, sem o tratamento adequado.

Na natureza, estas bactérias entram em contato com outros micro-organismos e antibióticos, fomentando um novo processo de seleção que potencializa a resistência. Águas poluídas ou alimentos contaminados podem colocar os indivíduos em contato com a bactéria que retorna ao hospital criando um ciclo.

Do O Dia