A violência em Cotia e a Campanha da Fraternidade 2018. Porque não expandir para além das paredes das Igrejas?

Por Joanton Silva

Para uma grande parcela da população brasileira vive-se o tempo da quaresma, período que tem como objetivo primordial a preparação para a celebração da maior e mais importante festa cristã: a Páscoa.

No Brasil, desde meados dos anos 1960, se propõe pela Igreja Católica que neste período se reflita sobre temas que atingem aos cidadãos e cidadãs brasileiras com a vivencia da “Campanha da Fraternidade”. Neste ano de 2018 a Campanha trata de um tema que está muito presente na vida dos brasileiros e, por que não dizer, dos cotianos.

Interessante perceber que, mesmo diante de um tema tão presente e tão grave, poucas ações se vê a partir da Igreja Católica no sentido de mobilizar, conscientizar, discutir com a sociedade local como enfrentar e superar a questão da violência. Parece até mesmo que das portas da Igreja para fora, não se faz necessária uma presença mais efetiva dos líderes e seguidores que estão em vias de celebrar a Ressurreição de Cristo.

O documento da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), sobre a Campanha da Fraternidade 2018, é muito denso de informações e alertas. De acordo com o documento base a Organização Mundial de Saúde define violência como o uso intencional da força contra si mesmo, contra outra pessoa ou contra um grupo de pessoas. Essa violência pode resultar em dano físico, sexual, psicológico ou morte.

Ainda segundo o texto base, os índices da violência no Brasil superam significativamente os números de países que se encontram em guerra ou que são vítimas frequentes de atentados terroristas. Apesar de possuir menos de 3% da população mundial, nosso país responde por quase 13% dos assassinatos no planeta. Em2014, o Brasil chegou ao topo do ranking, considerado o número absoluto de homicídios. Foram 59.627 mortes, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
A Igreja Define como Objetivo geral que neste período a sociedade possa Construir a fraternidade, promovendo a cultura da paz, da reconciliação e da justiça, à luz da Palavra de Deus, como caminho de superação da violência. Mas como conseguirá atingir esse objetivo se, ao andar pelas ruas da cidade não se vê a presença ou mesmo a intenção de conclamar os cidadãos a discutir e promover ações com vistas a uma cultura de paz?

Dados divulgados pelo jornal local “Cotia Agora” dão conta de que no ano de 2017 Cotia teve um recorde de registro de crimes, entre eles em estupro, roubos e furtos, segundo os dados oficiais da Secretaria Estadual de Segurança. Levando em consideração que muitos crimes não são relatados pelas vítimas, que preferem não fazer boletim de ocorrência. Informa ainda que em 2017, 29 pessoas foram assassinadas na cidade.

É preciso lembrar que os jovens compõem a maior parte desse contingente de vítimas.
O Atlas da Violência 2017 analisou dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, referentes ao intervalo de 2005 a 2015  O Atlas mostra também que o assassinato de jovens do sexo masculino entre 15 e 29 anos corresponde a 47,85% do total de óbitos registrados no período estudado. Dados do Mapa da Violência divulgados em 2017 mostram o quanto é preciso se pensar em programas e projetos de prevenção e segurança dos jovens como se pode ver na tabela abaixo:

violnAF= mortes por armas de fogo; Pos.UF = posição da cidade no ranking da violência do Estado de São Paulo  

Cotia é a segunda colocada no ranking regional (136ª no nacional) do abuso sexual infantil, com taxa de 21,1 casos por 100 mil moradores na faixa etária pesquisada. O município teve 14 casos de violência sexual, 12 de estupro, um de assédio e um de atentado violento ao pudor registrados em 2011 de acordo com o Mapa da violência 2015.

Um dado preocupante em relação à violência contra mulheres em Cotia. Nos 12 meses de 2017, a cidade teve registrados 67 casos de estupro, conforme dados divulgados pela imprensa local a partir de dados da Secretaria de Segurança do Estado.
Este índice é o maior desde 2013, quando foram registradas 49 ocorrências. Antes disso, em 2012, o recorde da história na cidade, com 73 casos. Após estes dois anos citados acima, nos seguintes o índice acabou sendo menor, com 36 em 2014; 33 em 2015 e 34 em 2016.

Segundo informações de autoridades policiais da cidade, estes números de 67 estupros são apenas os comunicados pelas vítimas ou parentes. Há muitos casos que acontecem e não são comunicados à polícia, em sua maioria, mulheres com medo de seus agressores, que em muitos casos, estão dentro da própria família.

Os dados foram apresentados pela Secretaria Estadual de Segurança Pública, que divulga mensalmente o índice da criminalidade no Estado. No caso de Cotia, dentre os quatro distritos policiais, 20 foram na região da Granja Viana, 13 em Caucaia e 34 na delegacia central.

Frente a tantas informações, é de se estranhar uma certa “letargia” por parte das lideranças da Igreja, sua pouca mobilidade no sentido de somar forças junto a outras lideranças religiosas, junto aos Conselhos de Direitos e setores da sociedade que precisam compreender a segurança pública para além de um caso apenas de polícia.

É preciso se atentar aos dados, e a outros que este artigo não vislumbrou tocar, mas que são perenes na vida da sociedade cotiana, tais como o tráfico e envolvimento de drogas por adolescentes e jovens, a violência doméstica, de transito, a falta de serviços de saúde pública…

… O sucateamento das escolas, a desvalorização dos profissionais da educação…. A própria falta de convicção por profissionais da educação de que seu trabalho deve contribuir para a formação de cidadãos melhores para uma cidade e um país melhor, isso também se configura como violência….